1. Na mensagem que nos dirige para esta Quaresma, o Santo Padre Bento
XVI inspira-se na palavra da Carta aos Hebreus: “Prestemos atenção uns aos
outros, para nos estimularmos ao amor e às boas obras” (Heb 10,24).
O Santo Padre diz-nos que na sociedade prevalecem a indiferença, o desinteresse
e o egoísmo, mesmo quando mascarados por uma aparência de respeito pelo outro.
Por isso, não podemos estranhar a actualidade da palavra dorida de Paulo VI ao
afirmar que «o mundo actual sofre sobretudo de falta de fraternidade: o mundo
está doente. O seu mal reside mais na crise de fraternidade entre os homens e
entre os povos, do que na esterilização ou no monopólio, que alguns fazem dos
recursos do universo» ( Populorum Progressio, 66).
Importa cultivar um olhar de fraternidade e de esperança que transforme o
coração indiferente diante do sofrimento humano e endurecido perante as
injustiças sociais num coração que vê com um olhar «feito de humanidade e de
carinho pelo irmão… olhar que ama e corrige, que conhece e reconhece, que
discerne e perdoa» (Mensagem da Quaresma de Bento XVI).
Esta mensagem de Bento XVI, dirigida a todo o mundo, encontra a Europa e
Portugal num momento complexo da sua história vivido com acrescidas
dificuldades que pesam sobretudo sobre os mais frágeis, os mais pobres e os
mais sós.
Neste Ano Europeu do Envelhecimento Activo e do Diálogo Intergeracional e em flagrante
contraste com quanto nesta iniciativa se pretende, temos sido confrontados
pelas notícias frequentes de idosos sós, condenados a morrer ao abandono.
Também aqui somos chamados a este olhar atento e a este dom recíproco de um
amor próximo, vizinho e irmão de cada um de nós pelos outros. As comunidades
cristãs têm aqui um campo imenso de presença e de acção.
Importa saber olhar os idosos como um dom de vida e de bênção e como uma escola
de sabedoria onde o futuro já começou e diariamente se aprende.
Mais do que lamentarmo-nos pelo declínio de uma civilização em fim de ciclo,
que a presente crise social indicia, devemos ser capazes de iluminar o mundo
com a luz transformadora que nos vem da Páscoa de Jesus. Importa cultivar este
olhar de fraternidade que pressente no horizonte sinais de esperança. Um olhar
atento é sempre fonte de sabedoria e de fraternidade a dizer-nos que um futuro
justo e solidário não é um destino distante nem um caminho inacessível.
2. A Quaresma é para os cristãos, e deve ser através deles para todo o
mundo, um convite a cultivar este olhar de fé, de esperança e de fraternidade e
a sonhar o mundo novo das bem - aventuranças que cada Páscoa nos traz.
A Quaresma é caminho rumo à Páscoa de Jesus e oferece-nos tempo, oportunidade e
sentido para a oração em família e em comunidade, para a vivência do jejum e da
sobriedade, para a celebração dos sacramentos e para o exercício da
solidariedade humana e da caridade cristã.
A Páscoa é para quem acredita em Jesus, vivo e ressuscitado, a fonte da
alegria, da esperança e da força transformadora das realidades do mundo. A
Páscoa é a luz da Vida Nova no Ressuscitado e o caminho de renovação e de
esperança para o mundo. Ela é o alicerce firme da nossa perseverança e
constância mesmo nos momentos mais difíceis da história humana e abre horizonte
a este olhar de fraternidade aprendido de Cristo no Evangelho e concretizado no
viver diário da Igreja e no agir solícito e interventivo dos cristãos em todos
os domínios da vida social.
Assim, também, na nossa Igreja diocesana que vive este tempo como abençoada
expectativa da Páscoa de Jesus. Centrados na família, ao longo da etapa
pastoral agora vivida, cultivamos este olhar atento para as famílias que somos
e para a nossa Igreja, fraternidade de famílias que confirma a esperança.
Preparamos, em cada dia que passa e em cada sinal de comunhão que damos, a Festa das Famílias a celebrar em 20 de Maio, em pleno
tempo pascal, como verdadeira expressão da alegria de sermos Igreja de Aveiro.
No horizonte próximo está o Jubileu da restauração da nossa Diocese e a Missão
Jubilar que desde já preparamos. Somos uma Igreja em missão jubilar pela
alegria que nos envolve, pelos objectivos que nos propomos, pelos caminhos que
abrimos, pelo testemunho de vida fraterna que damos e pelas bem-aventuranças do
Reino que anunciamos. Mas isto só será possível se acolhermos o dom de Deus e
vivermos atentos aos irmãos segundo o mandamento novo de Jesus. «Por isso é que
todos conhecerão que sois meus discípulos. Se vos amardes uns aos outros» ( Jo
13, 35).
3. Em cada Quaresma, somos convidados a uma experiência mais
significativa de renúncia daquilo que, por vontade livre e generosa, queremos
partilhar com pessoas e instituições que servem esta causa comum do amor
fraterno. Nesta Quaresma vamos orientar este sentido de dom e este esforço de
partilha para a Casa
Sacerdotal da nossa Diocese, já em fase avançada de construção, onde queremos
acolher os sacerdotes doentes e idosos, e para a Diocese de Luena, em Angola, à
qual nos unem laços de comunhão, fortalecidos pela presença de membros da nossa
Igreja Diocesana que aí têm realizado voluntariado missionário.
Também com estes gestos cultivamos um olhar atento de fraternidade, de comunhão
e de esperança.
Uma santa e fecunda Quaresma.
Aveiro, 11 de Fevereiro de 2012
António Francisco dos Santos, Bispo de Aveiro
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