sábado, 22 de março de 2014

Encontrada correspondência, censurada pelos nazistas, de uma Irmã de Maria de Schoenstatt


Cartas escritas pela Irmã Mariavirgo, Irmã de Maria de Schoenstatt missionária no Brasil, para a família na Alemanha, nos anos 40, foram retidas pelos nazistas e achadas agora no Colégio Mãe de Deus - Brasil.
 
 As correspondências enviadas outrora podem não ter chegado ao destino correto. Essa era uma das preocupações da Irmã Mariavirgo, Irmã de Maria de Schoenstatt, ao escrever de Londrina para familiares na Alemanha, em 1939. Entre as linhas, a grande questão: será que as cartas se perderam? Mal sabia ela que o governo nazista de Hitler (à frente do país entre 1933 e 1945) havia retido essa e outras correspondências enviadas em 1940 e 1941. Quase 50 anos depois de censuradas pelo Terceiro Reich, as correspondências foram devolvidas para o Colégio Mãe de Deus.
A surpresa veio na semana passada, enquanto um grupo de voluntários trabalhava na organização do arquivo do colégio, fundado em Londrina em 1936. “Achamos agora, em armários, arquivos e gavetas no acervo da irmã Maria Wilfried. São cartas enviadas para familiares e censuradas durante a Segunda Guerra Mundial”, conta Helenice Dequech, uma das voluntárias à frente da organização do acervo histórico do colégio.de Schoenstatt não sofreu apenas com cartas censuradas. Seu fundador, o padre José Kentenich (1885-1968), nascido próximo à região de Colônia, na Alemanha, chegou a ser preso pelo regime nazista, entre 1942 e 1944. “Ele ficou dois anos num campo de concentração de Dachau e durante quatro semanas foi colocado no bunker, totalmente fechado”, conta a irmã Rosa Maria, gerente administrativa do Colégio Mãe de Deus em Londrina.

 
Logo depois de sair do exílio, o sacerdote veio ao Brasil. Passou por Londrina diversas vezes entre os anos de 1945 e 1949. “Ele vinha acompanhar os trabalhos, trazer formação e aplicar a pedagogia que usamos até hoje, baseada no vínculo, no amor e na liberdade.” De acordo com a irmã, é importante resgatar essa parte da história. “É baseado no passado que se projeta o futuro. Por isso estamos fazendo esse resgate. O colégio vai completar 80 anos em 2016. Queremos resgatar isso, as irmãs que começaram do nada, junto com a cidade, numa escola de madeira da Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP)”, afiEm letras de caligrafia perfeita, provavelmente escritas em bico de pena, a Irmã Mariavirgo começa sempre com uma saudação religiosa: “Ave Maria...”. Todo o texto está escrito em alemão. Parte dele está sendo traduzido pela Irmã Ansgara, que mora nas dependências do colégio.
As primeiras palavras são dedicadas a saber notícias dos pais e irmãos. Mas já vai logo anunciando: “Os navios de países neutros podem aportar na Alemanha”, diz um trecho. Outro diz: “Pelos jornais daqui, as notícias não são boas, mas não se pode acreditar em tudo.”
O ano que a Irmã enviou esta carta coincidiu com o início do conflito mundial. E, ao que parece, outras cartas enviadas anteriormente podem também terem sido censuradas.
Mesmo assim, Irmã Mariavirgo quer tranquilizar a família: “Faço votos de que não se preocupem porque estou muito bem”, afirma. Ela conta que está trabalhando no jardim de infância, com 20 crianças, e que a maior dificuldade é o idioma, apesar de saber algumas poucas palavras, necessárias para o ensino.
Boa parte da correspondência traduzida é dedicada à descrição de como é o trabalho em Londrina. As primeiras irmãs chegaram por aqui em 1936, vindas de Jacarezinho, um ano depois de aportarem no Brasil pelo Porto de Santos, em 1935.
“A carta conta que Londrina tinha 12 mil habitantes, que a mata virgem foi derrubada para ter mais espaço e que por longos dias havia nuvens de fumaça das queimadas das árvores, que encobriam o céu”, conta Helenice Dequech.
À noite, Ir. Mariavirgo diz estar mais próxima de Deus, por conta do céu límpido que a permitia ver a constelação Cruzeiro do Sul. Não faltou, obviamente, o relato da terra fértil, das abundantes plantações de café e algodão.
Nos envelopes é possível identificar o destinatário: Ludwig Moser, na pequena cidade de Geislingen. Numa rápida pesquisa pela internet, é possível identificá-lo como o fundador, junto com o pai Leo Moser, de uma oficina de vidros, em 1857.
A empresa se tornaria uma conhecida e importante fábrica de vidros, que também sofreria com o avanço nazista.
Há nas cartas carimbos do alto comando nazista e uma delas tem o adesivo do censor 1162, provavelmente o funcionário que violou a correspondência.
 

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