Tem
rosto pequenino, olho vivo, cabelo preto e farto, como todas as
crianças da sua etnia, aquele menino, que uma funcionária da
Instituição aconchegava ternamente ao seu regaço de mãe.
Foi
a última criança a chegar nesta noite para a oração inicial que
fizemos, antes da ceia de convívio, à volta da mesa recheada e
decorada a gosto para a festa antecipada de Natal.
O
Abraão, assim se chama este menino lindo, frágil e pequenino, tem
16 dias apenas, tantos quantos este advento. O Abraão é a criança
mais nova daquela instituição da Igreja onde, semana a semana ou
mês a mês, chegam crianças, que não tiveram lugar em berços de
família ou casa em hospedarias da cidade.
Sabemos
que a mãe do Abraão teve de recorrer a uma instituição porque foi
abandonada pelo marido e não consegue sozinha cuidar do filho mais
velho, que é deficiente, e do mais pequenino, que agora nasceu. Por
isso desprendeu-se do mais saudável para cuidar do mais doente. São
assim as nossas mães! Sempre mais próximas dos filhos que mais
precisam!
Abraão
é nome bíblico de pai dos crentes, de homem de amarras soltas, de
arameu errante, de peregrino decidido a seguir o sonho de Deus e a
fazer caminhada rumo à terra por Deus prometida. Abraão é raiz de
um povo escolhido, primeiro habitante de uma terra abençoada e
tronco fecundo onde se enxertam muitas gerações de gente feliz.
Num
tempo de povos sem pátria, de nações sem paz, de pessoas
sem-abrigo, de lares sem amor, de famílias sem trabalho, de bocas
famintas, de emigrantes dispersos pelo mundo e tantas vezes
rejeitados e excluídos, de suicídios a aumentar, de violência a
crescer e de desalento a bater à porta de tanta gente precisamos
ainda mais do Natal de Jesus.
Temos
necessidade do Natal para que haja, ao jeito de Maria de Nazaré,
regaços fecundos de mães onde a vida se receba, famílias onde a
ternura, a bondade e a alegria se fortaleçam e comunidades cristãs
onde as bem-aventuranças do evangelho se vivam em cada passo do
caminho.
O
melhor presépio de Jesus será sempre o coração dos pobres em
espírito, dos puros, dos misericordiosos, dos pacíficos, dos que
fazem das bem-aventuranças critério de vida e se sentem tocados de
perto pelo amor do nosso bom Deus.
O
advento tem este ano para a Igreja de Aveiro um sentido novo, porque
iniciado em tempo de Missão Jubilar e vivido em plena Caminhada das
bem-aventuranças. Este advento quer ser caminho iluminado pela luz
da fé, pela força da esperança e pela presença do amor de Deus
que se faz quotidiano da vida para milhares de pessoas e de famílias
das cento e uma paróquias da nossa Diocese que se sentem mais
próximas, mais unidas e mais felizes e se decidem a sonhar uma
Igreja renovada e a edificar um mundo melhor.
Por
isso, este advento do Natal é, para a Igreja, advento do tempo
futuro, que desde já queremos antecipar e construir. No culminar da
caminhada das bem-aventuranças, o Natal deve fazer-nos sentir,
depois deste belo e bom caminho percorrido ao longo da Missão
Jubilar, que são felizes os que acreditam que Jesus está connosco
para fazer de cada um de nós presente de Deus para os outros.
A
Igreja tem na mão essa grande missão: fazer do mundo a sua casa, do
amor a sua arma, do tempo a sua hora, do chão da nossa terra a
pátria das bem-aventuranças para ser presépio onde Jesus se acolhe
e daí partir para anunciar a alegria do evangelho.
E
tudo isto só se consegue se fizermos dos presépios humanos berços
deste dom divino, que é Jesus, e se no rosto frágil do menino
nascido na gruta de Belém descobrirmos o rosto de Deus que nos ama,
nos envia o Seu Filho e nos chama a ser discípulos, missionários e
mensageiros em Seu nome.
Nesse
sentido e com esse espírito partilharei a Ceia de Consoada com os
sem-abrigo da Cidade e de junto deles partirei para a Eucaristia de
Natal na Sé.
A
Igreja aprendeu com Francisco de Assis a fazer presépios para Jesus
e reaprende com o Papa Francisco a ser casa de bênção e de ternura
para os que sofrem e a abrir a mesa de família e de refeição aos
pobres.
Celebrar
o Natal é, assim, para cada um de nós, para cada família e para
cada comunidade certeza de vida nova recebida de Deus, anúncio da
alegria do evangelho e apelo feliz a viver as bem-aventuranças do
reino.
Votos
de santo Natal e de abençoado Ano de 2014.
Aveiro,
16 de Dezembro de 2013
António
Francisco dos Santos, bispo de Aveiro
Sem comentários:
Enviar um comentário